Em seu primeiro discurso no Congresso, o presidente americano Barack Obama adotou a famosa doutrina do "big stick", criada por Theodore Roosevelt (1858-1919), para definir a política externa dos Estados Unidos. A frase "fale com suavidade, mas tenha na mão um grande porrete" entrou para a história e fortaleceu o comércio e a indústria do país, sempre protegidos a todo custo.
Na noite da terça-feira 24, diante das resistências republicanas ao seu plano de estímulo, da impopularidade de seu programa para salvar bancos quebrados e de um déficit fiscal de US$ 1,75 trilhão em 2009, Obama pediu apoio aos parlamentares, otimismo ao povo, prometeu desde a retomada econômica até a cura do câncer e, sobretudo, enviou um recado ao planeta: "O mundo depende de nós para ter uma economia forte, assim como nossa economia depende da força do mundo."
A frase
dita no fim do discurso, antes de o presidente enumerar seus heróis da
resistência (leia quadro abaixo), revela como Obama pretende tocar seu
plano de reconstrução da América ou, como ele espera, fazer os Estados
Unidos ressurgirem da crise mais fortes do que nunca. A suavidade de
sua fala aparece quando diz que está trabalhando com os países do G-20
para "restaurar a confiança do sistema financeiro e evitar a
possibilidade de escalada do protecionismo".
Já o porrete veio logo depois, quando o
presidente disse esperar que ocorra uma "impulsão da demanda pelas
mercadorias americanas nos mercados mundiais". Ele nem precisou ser tão
claro, mas um dos produtos que Obama precisa continuar exportando são
os títulos da dívida pública. Caso contrário, como mencionou, a
capacidade dos Estados Unidos de salvarem a economia do planeta é nula,
pois seus desafios domésticos são imensos. Obama enumerou
os três principais: educação, saúde e energia. Prometeu resolver todos
se tiver otimismo, boa vontade, apoio e outras palavras doces. Em
relação aos dois primeiros, a tática foi demonstrar para a população
que tem consciência de seus problemas agravados pelo desemprego. Em
termos de popularidade, tem funcionado. Obama chegou ao
Congresso calçado por uma pesquisa que lhe concede 67% de aprovação -
embora tenha caído nove pontos desde a posse. Mas logo depois
do discurso conseguiu elevar sua popularidade entre a bancada dos
republicanos, os mais resistentes aos seus projetos e à ideia de um
governo bipartidário. Os republicanos acusam os democratas de
elaborarem planos sem detalhes, insuficientes para abrandar a crise, e
de ampliarem o déficit público de "forma irresponsável". Em seu
discurso, Obama mencionou até o website criado pelo governo para
explicar "cada centavo" gasto. Na questão energética,
Obama quer reduzir a vulnerabilidade e a dependência dos Estados Unidos
do petróleo. Pretende dobrar a oferta de energia renovável nos próximos
três anos. "Achei o plano muito bom, mas ainda estou fazendo as contas
sobre o que o presidente vai fazer para viabilizar esta pauta enorme",
atacou o senador republicano John McCain, em entrevista na tevê, logo
depois do discurso. O duelo com os republicanos continuou no dia
seguinte, quando Obama anunciou aumento dos impostos para os mais ricos
como forma de pagar pela saúde dos mais pobres. Em seu orçamento de
2009, o presidente ainda incluiu a meta ambiciosa de encerrar o governo
com um déficit de US$ 533 bilhões, em 2013. As críticas
dos opositores recaem ainda sobre desperdício com licitações e despesas
com a guerra do Iraque. Mas a maior divergência ainda se refere à
possível nacionalização do sistema bancário. Minutos antes do discurso,
o presidente do Fed, Ben Bernanke, tentou afastar o fantasma de o
Estado assumir bancos, como o Citigroup e o Bank of America. "Não
precisamos ter propriedade dos bancos para trabalhar com eles", disse.
Bernanke chegou a marcar data para a recuperação econômica, se as
medidas do governo forem adotadas na íntegra: 2010. Como disse Obama, o mundo está assistindo ao que farão os Estados Unidos. Na
reunião do G-20, em Londres, no dia 2 de abril, Obama encontrará,
certamente, mais cobranças do que o mencionado trabalho de equipe.
No domingo 22, líderes europeus pediram um reforço de US$ 500 bilhões
no FMI - onde o principal provedor sempre foram os EUA. A Alemanha é um
dos países que fazem mais pressão com receio de ser obrigada a socorrer
os vizinhos do Leste Europeu para evitar o colapso do euro. O
Brasil trabalha para impedir, também como disse Obama, a "escalada do
protecionismo". Na primeira reunião com a secretária de Estado, Hillary
Clinton, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, reclamou do
chamado "buy american", o artigo do plano de Obama que protege os
produtos americanos. Ou seja, nenhum país está disposto a participar do
encontro somente para falar com suavidade.